
Escoriocracia: como a tecnologia coloca o pior da sociedade no poder

Acompanhar qualquer coisa na mídia hoje é um exercídio frustrante de controle do FOMO, mas de vez em quando, algumas coisas fisgam você. Uma entrevista de um top exec de publicidade da Digiday teve esse efeito no meu media debriefing depois do post de um colega. O exec falava, sem meias palavras, como a indústria da publicidade (e a de mídia, por tabela), têm um fetiche por novidades que é completamente irracional. Enquanto o sistema não encontrar alguns checks and balances, a situação vai só piorar.
Qual a questão aqui: bem, parte da coisa está no DNA de uma indústria que vive de previsões sobre mercados futuros. Mais do que qualquer outro setor, o nicho de tecnologia forçadamente avalia e aposta no que vai acontecer e até certo ponto ignora a realidade. A distorção da realidade, contudo, não está na característica especulativa natural do nicho, mas no hype desenfreado que a última década ampliou exponencialmente. A lógica de negocial que vale para todas as indústrias foi substituída por uma abordagem na qual o importante não é o que a coisa é, mas o que ela parece – e promete.
O milionário Warren Buffett, que se tornou o messias do investimento seguro depois da quebradeira de 2008 exatamente por sua cautela e eficiência nos investimentos tem um mantra: “Eu jamais coloco um centavo num negócio que eu não consiga entender como vai dar dinheiro”.
Em tese, essa é a voz do capitalismo encarnada. Negócios jamais têm uma finalidade que não seja a de obter o maior retorno possível. De Adam Smith até hoje, passando pela leitura de Karl Marx em Das Kapital, nenhum economista há de discordar. Mas no ambiente de tecnologia, os participantes sentem-se à vontade para colocar dinheiro no que não entendem (e às vezes, no que ninguém entende).
A avaliação de uma start-up (qualquer uma, não somente de media-tech niche) é feita em cima de valores concretos, sem que haja espaço para “achismos” (esse é um infográfico simples, mas funcional da coisa), mas a coisa desandou. Há três meses, o Tech Crunch fez um artigo abordando o exagero das avaliações de “unicórnios” que se encerra assim:
The bubble will not continue forever. Sectors that used to be super hot such, as cloud computing or mobile apps, are not disruptive anymore, and in a few years AI and automotive will also lose their shine. It will still take quite a few years for all these innovative companies to meet real infrastructure and cultural change, and the innovation industry is about to crunch. When that happens, consumers will realize they don’t need so many me-too products around them, and as the interest rates begin to rise again and VC vintages are over, we may see valuations turn the current game much more “interesting” — or perhaps even a much less friendly term.
Iniciativas digitais levantaram centenas de milhões de dólares em investimento de 'venture capitalists', mas a maioria delas jamais chegará às terra prometida.
Os gigantes da tecnologia redesenharam o jeito de ganhar dinheiro, mas no processo, podem estar comprometendo a concorrência e o que a sociedade precisa.
O debate público é o cerne de uma democracia saudável, mas hoje, isso ocorre cada vez menos e a tecnologia pode estar por trás disso.
Nenhuma rede social presta um serviço tão fundamental para a sociedade como o Twitter. Mesmo assim, uma série de circunstâncias está forçando o microblog a mudar características que são o cerne de sua identidade. Isso representa uma ameaça ou uma evolução?
Nesta semana, em Londres, o evento News:Rewired reuniu profissionais da área para discutir o futuro: jornais, notícias, mídias sociais e variantes. Infelizmente eu não pude ir, mas um brilhante wrap-up do evento foi feito por um colega de trabalho, Simon Garner, o Head of News do Yahoo no Reino Unido. E sim, as corporações batem cabeça, sim, a maioria dos jornais está cavando a própria cova e sim, a luta contra o processo digital é a típica reação do velho fadado a sucumbir ao novo. Mas apesar de tudo isso, tudo indica que perspectivas entusiasmantes estão surgindo para a indústria e a sociedade só pode comemorar.